Já fazia um ano que, todas as noites, ouviam-se gritos apavorados vindos da casa ali na esquina, ali em frente, e barulho de objetos se quebrando, e berros roucos de um marido ensandecido.
Os vizinhos resolveram que era hora de fazer alguma coisa. Alguém correu ao bar e ligou para a polícia. O camburão demorou a vir e, quando enfim chegou, encontrou a casa em perfeita paz.
Do lado de fora, as muitas vozes se atropelavam para ver quem dizia primeiro, quem tinha ouvido mais gritos, muitos gritos, coisa horrorosa, tem que mandar capar ou prender.
Os policiais, que calados chegaram e calados continuavam, foram averiguar. Tocaram campainha. Perguntaram à mulher se era verdade que seu marido lhe batia já há algum tempo.
E de seus lábios trêmulos brotou uma vozinha fraca, quase um cochicho, o casulo de um grito:
- Ó, seu guarda. Bater ele não bate. Ele só me chuta e me enforca.
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