Sobre a tal ida à Vila Estrela, ainda não encontrei uma forma de contar. Mas vou contar assim mesmo, ao menos em parte.
Minha visita teve a ver com uma moça que vigiou meu carro enquanto eu almoçava em um restaurante aqui perto de casa. Viciada em crack há dois anos, ela não fuma há quase três semanas. Ela estava sendo ameaçada de morte pelos traficantes, porque estava devendo sessenta reais. Por isso, vinha passando as noites na rua, perto do tal restaurante ali na esquina, ali em baixo, sem poder subir. Não pôde participar da festa do dia das mães promovida pela escolinha do morro. Ela tem três filhos. Naquele dia, antes que o sol apontasse (para não ser vista), tinha ido a sua casa para pegar uma muda de roupas. Aproveitou para dar um beijo nos filhos e coar um café pra mãe.
Durante as últimas três semanas, sem pouso, ela começou a ter contato com a graça libertadora de Deus de uma forma que, para qualquer um de nós, pareceria que Deus está agindo no conta-gotas. Aparentemente, as coisas não haviam mudado tanto. Mas para a moça eu acho que era o bastante (Javé sabe o que faz), porque ela demonstrava uma alegria inenarrável por estar descobrindo O Totalmente Outro. Para ela, era como se uma forte chuva de graça estivesse descendo do céu sem nuvens, e ela dançando e comendo as gotas da chuva. Eu vi.
Uma moça jurada de morte, viciada há dois anos, finalmente passou três semanas sem fumar crack. Ela atribui o fato à libertação que vem de Deus. Para muitas pessoas lá no morro, é apenas fogo de palha: "Ela vai voltar, essa aí não tem jeito". Para mim, o maior milagre da Terra; o momento em que Deus se revela a um pequenino e o toma nos braços. Isso é o bastante para encher meu mundo todo de alegria.